Denuncia Pública

Silenciamentos dentro do PCP

Riley Morgan

Riley Morgan

· 7 minutos de leitura
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NOTA: O texto que se segue faz parte do espaço "Denúncia pública", onde os seus artigos não são escritos pelo EDR, mas sim por pessoas que tenham enviado o seu testemunho e experiência dentro do PCP e/ou JCP.

Decidi expor publicamente um acontecimento de algum tempo atrás numa reunião em que participei dentro do PCP. Refletindo algumas das histórias que me vêm sendo contadas, sendo quase ipsis verbis a situação que conto aqui, achei pertinente partilhar dada a circunstância da publicação do artigo sobre a transfobia pelo EDR.

Apelo a todos os camaradas que estejam a ler isto e que tenham sofrido com situações similares a que façam como eu e exponham estas questões publicamente, para mostrar que isto não é um problema único e individual, senão é um problema estrutural do PCP, e que enquanto militantes não poderemos continuar a deixar que silenciem estes problemas.

Iniciou-se uma discussão uma semana antes acerca da transfobia no partido dentro do grupo do organismo, aquando de eu ter partilhado informações acerca do mesmo vindo de certos militantes como o Miguel Tiago. A resposta na altura, depois de uma troca com arrogância e ridicularização por parte de outros militantes, foi de que se deveria debater este tema em reunião. Chegando em reunião, e após muito tempo perdido com outros temas maioritariamente de logística, sem grande espaço para maiores críticas, finalmente abriu-se espaço para este debate em concreto. Começando logo por dirigentes denotarem que o tempo já não seria suficiente para todas as questões, e que deveria ser o mais sucinto possível.

Eu comecei por apresentar todos os casos públicos, relatos e evidências, tal como havia sido pedido previamente em grupo. Tudo isto está disponível neste artigo por Félix de forma sucinta.

Este debate passou por várias fases:

  • Inicialmente, por negação dos acontecimentos por parte dos dirigentes visto que “eram casos individuais” e que não representavam a realidade concreta das ações coletivas das organizações do partido (o que não se comprova, visto que isto já foi várias vezes denunciado coletivamente em várias instâncias do partido, resultando sempre em expulsão). Da parte dos militantes, também essa negação, aliada com a justificação dos acontecimentos como algo geracional, “alguns camaradas não estão a par do assunto e têm opiniões menos boas”.
    • Ora se esse fosse o caso isto não teria de sair para a esfera pública e toda a disputa interna que vem a ser feita (ou a tentativa de) teria sido consequente, na medida de criar um espaço seguro para as pessoas LGBTQIA+, não fosse o silenciamento e afastamento constante de militantes do partido. Mais, estamos a falar também de pessoas com altos cargos no partido que, independentemente da plataforma onde anunciam a sua transfobia, são representantes do mesmo e vêm a ser defendidos através das ações mencionadas em cima. E isto quase beira o ridículo de tentar apresentar membros transfóbicos como vítimas, como foi em outros casos dentro do partido de equiparar estes a alcoólicos;

  • A fase seguinte passa por militantes me acusarem de várias coisas, sem grande intervenção dos dirigentes: de “misógino”, de “anarcoide”, “esquerdista”, “arrogante”, entre outras coisas. Levando todas as críticas válidas à conduta do partido para o campo pessoal. Os dirigentes, por outro lado, abandonam a posição de negação dos acontecimentos: assumem que eles acontecem, e justificam pelo facto da independência de cada organização, de que cada organização deve gerir os seus militantes da forma que achar melhor, e que novamente os militantes não podem ser responsabilizados individualmente pelas suas opiniões. Mais, justificam que estes acontecimentos são descontextualizados.
    • Novamente não só continuam a tentar justificar que existam militantes transfóbicos dentro do partido, justificam que a ridicularização da identidade de género de pessoas trans em diversos meios é “descontextualizado”. Mesmo dentro de contexto, todas as intervenções foram feitas ou em resposta a indívidues trans ou em resposta à comunidade queer em si;
  • Depois passa por os dirigentes tentarem dizer que não havia tempo e o nosso organismo não é responsável por estes debates e que não deveriam ser feitos nestas reuniões. Que estas discussões não deveriam ser tidas nestes espaços. Acrescentando ainda que toda a informação que partilhei deve ser apagada. É me dito que isto será mencionado a um órgão acima, mas apenas a existência deste debate.
    • Isto não só é contraditório ao que me foi dito anteriormente, como para além de todo o conteúdo que apresentei ser descartado, acabou por ser encerrado o espaço onde poderia discutir o mesmo em detalhe.

Isto é apenas mais uma denúncia entre as várias que vêm a ser feitas por militantes queer dentro dos seus espaços, sendo estus forçades a vir a público para expressá-las quando o debate interno é lhes negado. Acabei por pedir uma resposta do comité central acerca da questão, que depois de 3 meses ainda não recebi, nem notícias acerca da mesma.

Para acrescentar, no momento em que trouxe críticas em plenário acerca de questões relativas às teses e ao congresso, foi me pedido que mantivesse as mesmas em reunião, por respeito à “ordem dos debates” e à linha do partido, contraditório ao que me foi dito previamente acerca da discussão destes temas, seguido de acusações passivas de militância dupla e de ser “fantoche” do Ruptura, completamente desprovidas de bom senso e honestidade.

Por mais que se insista em manter o debate internamente, este é uma e outra vez espezinhado quanto mais ele se torna disruptivo da linha partidária.

O definhamento ideológico do partido, a sua estagnação intelectual do e dos seus militantes, a sua prática inconsequente e a normalização e abafamento de abusos não só são consequências da falta de polémica e discussão, mas também do abandono da luta de classes e da teoria revolucionária, em geral, do programa comunista. Não caiamos na defesa da unidade abstrata que, por si só, quebra qualquer unidade existente. Nunca poderá ser em defesa de quem perpetua a opressão dos seus militantes mais vulneráveis na sociedade e só será construída com a polémica pública, com a crítica e a autocrítica.

Riley Morgan

Riley Morgan

"Sem teoria revolucionária, não pode haver movimento revolucionário"


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